“E apenas sigo a minha sina de andador de calçadas, de praças, de ruas, de pequenos gestos de boa gentileza, um bom dia aqui, outro acolá, um ajudar de sacola, um apenas seguir de sempre procurar um lugar para descansar pernas cansadas e voltar para casa.” O trecho da crônica “Assim Será”, de Zeza Amaral, publicada no Hora Campinas, pode ser considerado o retrato da vida de um autor que agora descansa. Campinas amanheceu cinzenta nessa quinta-feira (3), como se refletisse o luto gerado pela partida de quem tão bem a sintetizou em suas crônicas. José Antonio Siqueira do Amaral, o Zeza, figura lendária do jornalismo campineiro, músico, autor e compositor, morreu dormindo no sítio da família, em Vargem Grande do Sul, aos 78 anos. O velório acontece no cemitério Parque Flamboyant, nesta sexta-feira (4), entre 6h30 e 11h30.
Leitores, ouvintes, amigos e companheiros de profissão, ainda em choque, buscavam palavras para definir o tamanho da perda nesta quinta-feira. Por outro lado, o legado deixado no olhar gentil e acolhedor e na vida simples de um andarilho da trajetória cotidiana ganha contorno imensurável. Talvez inspiração para a vida seja a palavra que defina o fruto brotado de suas digitais.

“Tanta coisa para falar dele”, diz o jornalista e músico Adriano Rosa, amigo e parceiro de composição. “Sim, éramos parceiros de composição, mas não por sentarmos juntos. As crônicas que ele escrevia me inspiravam a criar ideias que, retratadas nas vozes e instrumentos, se transformavam em novas canções.”
O jornalista Gilberto Gonçalves também se manifestou. “A sua partida, é certo, vai deixar por aqui uma brecha grande entre os homens de boa vontade. Fica apenas a saudade que também se dissipará com o tempo. Mas ele estará aqui, sempre, marcando o como das teclas que produziram textualmente histórias verdadeiras…”
Para o jornalista Wilson Lima, as crônicas de Zeza possibilitavam enxergar situações do cotidiano que avam despercebidas na correria da rotina. “Ler seus textos era um deleite, as lembranças de Campinas estavam sempre presentes naquilo que ele escrevia”, comenta o jornalista, companheiro de boteco e de redação do cronista. “Era uma pessoa gentil, generosa e com uma sensibilidade aguçada. Vai deixar uma lacuna no jornalismo e no universo cultural da cidade.”

Adriano e o também músico e jornalista Clayton Roma vinham alimentado as redes sociais e o YouTube com o acervo de músicas e crônicas de Zeza. Um CD com o amigo Sapo, da Banda do Brejo, grupo de rock rural fundado pelo cronista, estava em processo de finalização em Valinhos. “Ele nunca deixou de produzir”, diz Adriano, acrescentando que o novo trabalho conta com a participação do guitarrista da banda de Roberto Carlos, Elias Almeida.
Zeza nasceu em Atibaia, mas veio para Campinas ainda criança e desde cedo mostrou seu talento para a música. The Snacks, The King’s, Guitar’s Boys, Conjunto 707 , Phórmula Seis e Orquestra Paulo Afonso são alguns grupos de baile nos quais atuou como vocalista e percussionista. Como compositor e intérprete, participou de vários festivais e ganhou prêmios, sendo o Prêmio Sharp de Música com o LP “Clareia”, em 1987, um dos principais.
Como jornalista, a trajetória começou no final dos anos de 1960 na função de repórter policial no Diário do Povo, jornal no qual trabalhou por 32 anos em dois períodos: de 1968 a 1984 e, posteriormente, entre 1996 a 2012. Foi ainda cronista do jornal Gazeta do Cambuí e revista Metrópole, além de ter sido colaborador do jornal de Monte Sião. No Hora Campinas, também deixou suas crônicas registradas.